Eles são irmãos. Não que sejam filhos da mesma mãe. Os pais pouco se
conhecem. Eles se escolheram empinando pipa, jogando bola e fugindo da hora
de voltar para casa.
No Poço da Panela, toda criança tem seu companheiro. A diferença deles dois
é que puderam escolher a quem ter como irmão. E eles se divertem com isso.
Quando a mãe de Juca briga com ele, os dois podem se esconder na casa de
Chico. Além disso, nem precisaram nascer gêmeos para serem da mesma idade.
As roupas de um quase sempre cabem no outro. Os dois aprenderam a ler
juntos. E são ótimos para dar coragem ao outro quando escurece e eles ainda
não voltaram para casa.
Chico gosta de brincar com o amigo porque Juca enfrenta todos os desafios.
Ele sempre tem medo de atravessar o Capibaribe e, quando vai, acaba
colocando a culpa no amigo.
Juca gosta de correr perigo. Joga bola com os mais velhos. Adora espiar a
irmã dos amigos trocando de roupa. E, não contem para ninguém, ele adorou a
vez que teve de pular no rio para pegar uma bola.
Na hora que eles fazem besteira, é sempre Chico que aparece para levar a
primeira reclamação. Depois, ele acaba colocando a culpa toda no colega. E
Juca se chateia, mas logo esquece.
Os pais deles adoram ver os meninos brincando. Também, é um alívio enorme
quando Juca desliga a TV e Chico consegue tirar a cara do video-game.
Até nessas horas os meninos gostam de estar juntos. O pai de Juca é o
primeiro a pedir para os dois irem brincar. "Desliga essa máquina de fazer
doido!"
As vezes eles até desligam. Mas, com certeza, não é por causa dos gritos que
levam. Os dois parecem que nem notam quando recebem uma reclamação.
A sorte também é que não tem TV à cabo na casa dos meninos. Assim, quando
começa um programa chato eles acabam se lembrando de ir para a rua brincar.
Ali por perto, o chute de direita de Juca é conhecido de todos os
maloqueiros. E ele se orgulha quando é escolhido para jogar no time dos mais
velhos.
As brincadeiras de Chico são mais com o pessoal da mesma idade dele. Viaja
em histórias que ele mesmo cria, tem um enorme arsenal de piadas e gosta de
inventar uns jogos malucos.
Mas ele também adora jogar baralho com os mais velhos. Qualquer dia, vai
estar em Seu Vital enfrentando os cachaceiros de plantão.
Tomara que ele aproveite um dos momentos em que Juca esteja brincando na
frente da igreja, para quando um dos dois se meter em encrenca o outro estar
por perto para ajudar.
Os pais de Chico se separaram. E vai demorar para quererem ter outros
filhos. Os pais de Juca estão bem casados. Mas pensam que já passaram da
idade para fazer mais uma criança.
Restou para esses dois a opção de virarem irmãos de verdade. Parece que não
foi tão ruim assim. Pelo menos por enquanto, eles vivem uma infância que
quase não existe mais.
Tomara que eles aproveitem mesmo. Quando passar, não volta mais.
Soltei a âncora mais uma vez. Vim passar um ano morando em Nova Orleans e quero contar para os amigos algumas histórias sobre minhas pedaladas aqui na América do Norte. Sou geminiano, então pode esperar tudo menos uniformidade!
30.1.07
25.1.07
Ao meu amigo candidato
Faz tempo que nossas vidas se cruzam. As vezes como companheiros leais. Outras fomos também rivais disfarçados. Mas o respeito sempre esteve acima das nossas divergências. Quando finalmente decido que está na hora de me afastar da política (ou pelo menos adotar uma outra perspectiva), ele volta a pensar em participar. Sempre disse a ele que talento não lhe faltava, aliás sobra. O que houver de ausência de experiência poderá ser utilizado como um espaço de crescimento. Por sinal, não há nada nesse País que me deixe mais triste do que a falta de coragem da juventude para enfrentar a política de peito aberto. Todo o descrédito dos parlamentares e gestores públicos em geral torna ainda mais difícil acreditar em um projeto coletivo encabeçado por uma pessoa, representando um grupo. Mas isso cria um desafio ainda mais emocionante de ser tocado.
Por que então não estou gostando da idéia de finalmente ver meu amigo candidato? Lembro da primeira aula de minha pós-graduação, na FGV, quando a professora falava sobre o mercado das ONGs. Ela fez toda uma mercantilização dos processos, deixou que os alunos fossem se interessando pela coisa, acreditando que poderiam ganhar muito dinheiro com aquela história e arrematou mostrando com muita convicção que daquela forma todos os nossos planos estavam desvirtuados. Estávamos partindo de um projeto pessoal, quando a lógica (inclusive constitucional) das entidades sem fins lucrativos é de que tenham como princípio o bem coletivo. Tudo isso para que a gente se lembrasse na frente, anos depois, quando estivéssemos vivendo uma situação limite, precisando aprovar algum projeto, que todo esse esforço precisa estar ainda balizado por conceitos éticos (por mais genérico que isso possa parecer).
Estava quase deixando de acreditar na política. O sonho do PT, um partido de massas que discutia suas propostas e crescia coletivamente, acabou-se antes para mim do que para a maioria dos brasileiros. Para meu amigo talvez tenha sido um pouco mais cedo ainda. Mas, antes que eu deixasse de acreditar por completo, conheci uma realidade muito menos utópica, mas também bastante efetiva na luta por justiça social. As melhores frases que ouvi de Roberto Leandro foram as dele se justificando por realizar atividades que não lhe renderiam nenhum voto: "A gente passa o dia com a cabeça quente na Fundac, vai para o rádio e sabe que o povo pensa que estamos defendendo criminosos, então vamos comer muito bem que é para valorizar o nosso dia". Ele me disse em Caruaru, depois de denunciar um juiz que tinha mandado para um lugar horrível uma criança de 12 anos, acusada de roubar alguns potes de iogurte.
É difícil conciliar a tarefa de ser um representante da população com a de ter de conquistar votos. O que mais fiquei feliz em conhecer Roberto Leandro foi saber que existem políticos que realmente recebem o salário e pensam que têm que justificar aquele dinheiro todo com trabalho, suor. Quando teve tiro na Praça do Carmo ele foi para cima, "é meu dever como presidente da Comissão de Defesa da Cidadania". Quando apanhou de policiais por estar querendo testemunhar uma desocupação de terras ainda teve de aguentar uma cobertura jornalística muito pequena. Reclamou comigo pelo menos, com certeza, mas ele não esperava ser agredido quando resolveu que iria passar da barreira organizada pela PM. E em sua despedida da Assembléia Legislativa ainda teve que ouvir que era um cara chato, quando na verdade é uma ótima companhia para uma mesa de bar, porque enfrentou privilégios como o jetom.
Acabou que esse deputado estadual não se reelegeu. Vai continuar sua trajetória política de alguma outra forma, pelo menos espero. Mas, para mim, a lição dele vai ficar. Não adianta gerar um projeto dos nossos próprios umbigos. Mas precisamos valorizar e defender nossas perspectivas. A dura tarefa de exercer a representação política é uma missão que precisa ser encarada e enfrentada pela nossa geração. Esta ai Chico Alencar a me mostrar um mandato que tem na internet uma ferramenta contínua de geração e alimentação de demandas e utopias. Só para citar um exemplo de novidade no campo da política brasileira. Então, vai realmente encarar a tua sina? Pare. Chame os amigos. Tenha idéias. Realize. A sombra é grande demais para fugir totalmente dela, mas é preciso gerar novos conceitos que ultrapassem os limites até agora testados. Assim, talvez, você consiga conciliar a prática com a utopia.
Para desistir do sonho, é melhor nem entrar.
Por que então não estou gostando da idéia de finalmente ver meu amigo candidato? Lembro da primeira aula de minha pós-graduação, na FGV, quando a professora falava sobre o mercado das ONGs. Ela fez toda uma mercantilização dos processos, deixou que os alunos fossem se interessando pela coisa, acreditando que poderiam ganhar muito dinheiro com aquela história e arrematou mostrando com muita convicção que daquela forma todos os nossos planos estavam desvirtuados. Estávamos partindo de um projeto pessoal, quando a lógica (inclusive constitucional) das entidades sem fins lucrativos é de que tenham como princípio o bem coletivo. Tudo isso para que a gente se lembrasse na frente, anos depois, quando estivéssemos vivendo uma situação limite, precisando aprovar algum projeto, que todo esse esforço precisa estar ainda balizado por conceitos éticos (por mais genérico que isso possa parecer).
Estava quase deixando de acreditar na política. O sonho do PT, um partido de massas que discutia suas propostas e crescia coletivamente, acabou-se antes para mim do que para a maioria dos brasileiros. Para meu amigo talvez tenha sido um pouco mais cedo ainda. Mas, antes que eu deixasse de acreditar por completo, conheci uma realidade muito menos utópica, mas também bastante efetiva na luta por justiça social. As melhores frases que ouvi de Roberto Leandro foram as dele se justificando por realizar atividades que não lhe renderiam nenhum voto: "A gente passa o dia com a cabeça quente na Fundac, vai para o rádio e sabe que o povo pensa que estamos defendendo criminosos, então vamos comer muito bem que é para valorizar o nosso dia". Ele me disse em Caruaru, depois de denunciar um juiz que tinha mandado para um lugar horrível uma criança de 12 anos, acusada de roubar alguns potes de iogurte.
É difícil conciliar a tarefa de ser um representante da população com a de ter de conquistar votos. O que mais fiquei feliz em conhecer Roberto Leandro foi saber que existem políticos que realmente recebem o salário e pensam que têm que justificar aquele dinheiro todo com trabalho, suor. Quando teve tiro na Praça do Carmo ele foi para cima, "é meu dever como presidente da Comissão de Defesa da Cidadania". Quando apanhou de policiais por estar querendo testemunhar uma desocupação de terras ainda teve de aguentar uma cobertura jornalística muito pequena. Reclamou comigo pelo menos, com certeza, mas ele não esperava ser agredido quando resolveu que iria passar da barreira organizada pela PM. E em sua despedida da Assembléia Legislativa ainda teve que ouvir que era um cara chato, quando na verdade é uma ótima companhia para uma mesa de bar, porque enfrentou privilégios como o jetom.
Acabou que esse deputado estadual não se reelegeu. Vai continuar sua trajetória política de alguma outra forma, pelo menos espero. Mas, para mim, a lição dele vai ficar. Não adianta gerar um projeto dos nossos próprios umbigos. Mas precisamos valorizar e defender nossas perspectivas. A dura tarefa de exercer a representação política é uma missão que precisa ser encarada e enfrentada pela nossa geração. Esta ai Chico Alencar a me mostrar um mandato que tem na internet uma ferramenta contínua de geração e alimentação de demandas e utopias. Só para citar um exemplo de novidade no campo da política brasileira. Então, vai realmente encarar a tua sina? Pare. Chame os amigos. Tenha idéias. Realize. A sombra é grande demais para fugir totalmente dela, mas é preciso gerar novos conceitos que ultrapassem os limites até agora testados. Assim, talvez, você consiga conciliar a prática com a utopia.
Para desistir do sonho, é melhor nem entrar.
19.1.07
O direito de sonhar
Marcelo Campello apareceu de repente. O dia não era de Mombojó, muito menos de Del Rey, pedi para ele o CD Projeções. Insone desde criança, não acreditei que realmente fosse dormir quando ele falou: "O maior elogio que vocês podem fazer ao meu disco é caírem no sono antes da quinta faixa". Não é que eu realizei. E justo na hora que pensava ter perdido o direito de sonhar. É ótimo para escrever também, suficientemente lento para se pensar na próxima linha, mas com uma beleza tranquila que não deixa que os sentimentos atrapalhem o trabalho árduo da escrita. Para mim, o CD de Marcelo supera as expectativas, talvez até mesmo do compositor, que encontrou um jeito suave e autoral de fazer música de qualidade.
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