Estava almoçando com um amigo e ele me disse uma frase que
achei interessantíssima: “o ciclista pode ser um motorista sem carro”. Achei
melhor ainda porque pedalando de volta para minha casa na ciclofaixa da Estrada
do Encanamento tive de frear porque um senhor estava querendo atravessar a
avenida e não me viu pedalando no sentido contrário dos carros.
Fiquei pensando nestas duas questões, a responsabilidade do
ciclista e também a do poder público municipal no sentido de sinalizar as vias
e evitar acidentes, ao mesmo tempo em que as pessoas consigam se locomover com
eficiência.
Apesar de gostar de bicicleta, meu amigo não consegue
pedalar porque perdeu parte da flexibilidade e mobilidade de uma das suas
pernas. Quer dizer, ele frequenta os #ocupeestelita, esteve no protesto da
Agamenon, faltou o do Cinema São Luiz, mas numa Bicicletada não tem como ele
estar porque não consegue pedalar nem em bicicleta ergométrica. De sua maneira
educada, ele me contou alguns episódios em que como pedestre se sentiu ameaçado por
ciclistas que utilizam as calçadas, não respeitam os sinais de trânsito ou
cometem algum outro tipo de irregularidade.
O que achei mais interessante é que olhando para meu amigo ninguém
imagina que ele tem problema de mobilidade. Quer dizer, em cima de uma
bicicleta em velocidade rápida, eu poderia esperar uma reação dele para
se safar de uma colisão que ele simplesmente não tem como realizar, porque
mesmo fazendo fisioterapia, caminhando na praia e malhando ele não consegue ter
a flexibilidade/mobilidade na perna que para a maioria é normal.
Aprendi a pedalar com três anos. Talvez a lembrança mais
antiga da minha vida tenha sido em cima de uma bicicleta, o dia em que levei
uma mordida de um cachorro chamado Cenoura.
Ainda criança, criava circuitos imaginários de bicicross subindo e
descendo as calçadas do Poço da Panela. Quer dizer, para mim vai ser sempre um
prazer muito grande ultrapassar as barreiras da nossa cidade em cima de uma
bicicleta, mas aprendi já há um tempo que lugar de ciclista é na rua para
evitar acidente com os pedestres.
É uma coisa que muitos ciclistas, como eu, têm de prestar
atenção, porque é fácil ceder à tentação de meter uma mountain bike para cima
do meio-fio e ganhar alguns segundos no trajeto (e até dá para fazer isso
andando, como tenho feito muitas vezes com minha Caloi 10). Já em relação aos
sinais de trânsito, eu não vou mentir, por mais que as bicicletas devam
respeitar a sinalização muitas vezes é mais perigoso esperar o verde no sentido
que estamos indo do que furar o sinal, já que nossa cidade não tem uma
sinalização que respeite os direitos dos ciclistas.
Me vem à cabeça um cruzamento aqui bem perto de casa, logo
após à Praça de Parnamirim. E vou falar dele para chegar à minha sugestão para
a ciclofaixa das Estradas do Arraial e Encanamento. Após o Serpro (na 17 de
Agosto), muitos carros viram à direita em direção à Torre. O ciclista que para
no sinal vermelho e quer seguir adiante fica numa situação complicada para
concorrer com a enorme quantidade de carros. É o tipo de situação que em uma
cidade planejada também para os ciclistas haveria um tempo semafórico para as
bicicletas.
Por enquanto, é preciso pensar no cuidado
necessário para evitar a colisão naquele trechinho de faixa de pedestre,
especialmente nessa hora em que o ciclista sabe que precisa passar o sinal
antes do verde ou pelo menos estar à frente dos carros para poder cruzar a via
antes dos veículos começarem a dobrar. Existe uma solução eficiente para
cruzamentos, que é deixar uma área à frente dos carros para os ciclistas, mas nesse
caso a solução ideal é outra e por isso vou começar a falar da minha
experiência como ciclista na ciclofaixa aqui da Zona Norte.
Quando eu vi a sinalização meu primeiro comentário foi de
terror. “Estão querendo transformar o
Hospital Agamenon Magalhães em uma unidade especializada em traumas de
ciclistas?” A sinalização da ciclofaixa naquele cruzamento é um risco para os
desavisados, já que os carros fazem a curva em alta velocidade. (Mas isso pode
ser visto facilmente nesse vídeo aqui).
Agora, a Prefeitura do Recife vem dizer publicamente que
terá de tirar a ciclofaixa do Arraial porque os ciclistas estão andando na
contramão? Isso é uma falácia. Quem anda no sentido contrário da Rosa e Silva é
uma minoria de irresponsáveis que faz o mesmo na Rui Barbosa (ou na Agamenon) e
deveríamos há muito tempo ter previsto uma forma de punir esses ciclistas. A
ciclofaixa é perigosa porque passa por um cruzamento em que os motoristas
costumam entrar muitas vezes acima dos 40 ou até 60km/h.
Além disso, não foi feita nenhuma sinalização para avisar
aos motoristas do fim da terceira faixa após a Tamarineira. Eu mesmo, no meu
carro, já me peguei dirigindo sobre a ciclofaixa porque é muito menos efetiva a
sinalização horizontal e irresponsavelmente o Governo Municipal não indica o
fim da faixa da esquerda dos carros.
Para se ter ideia de como é necessária e urgente uma
melhoria na sinalização, lembro que a Prefeitura diz publicamente que a
ciclofaixa é unidirecional, mas não existe nenhuma sinalização vertical ou mesmo
horizontal que mostre isso para o ciclista que não leu o jornal no dia da
implantação do binário. E, vamos ser sinceros, não existe porque se qualquer
usuário sabe que aquela alternativa de tráfego para bicicletas só serve sendo
bidirecional, os técnicos da CTTU também têm essa noção.
Finalmente, cheguei ao ponto em que comecei. Eu consegui
evitar a colisão com um pedestre na Estrada do Encanamento porque estava há uns
20km/h. Mas qual o limite de velocidade para bicicletas naquela ciclofaixa?
Mesmo lendo quase tudo que saiu sobre essa polêmica, nunca soube dessa
informação e não tem placa nenhuma indicando. E, principalmente, porque o
Governo Municipal não admite que a ciclofaixa bidirecional é um sucesso e
implanta a sinalização afirmando que os ciclistas podem trafegar nos dois
sentidos? Isso seria uma forma de avisar também aos pedestres, para que tenham
essa atenção extra ao cruzar as vias. (Pessoalmente, acredito que a Prefeitura pode até vir
a implantar uma sinalização indicando uma direção apenas, mas vou continuar defendendo
que os ciclistas utilizem a ciclofaixa nas duas direções e me desculpe quem discordar). Mas é preciso reforçar, especialmente agora
que não tem sinalização, que o ciclista tenha atenção redobrada e pedale numa
velocidade mais lenta que o normal.
Em relação ao perigo na Estrada do Arraial para os
ciclistas, a minha sugestão vem dos primeiros projetos que vi para a Zona Norte
quando era assessor de imprensa da CTTU, na época da implantação do binário
Domingos Ferreira-Conselheiro Aguiar. O Governo Municipal não deve tirar a
ciclofaixa dali antes de implantar a continuação do trajeto pela Rua do Futuro,
transformando uma das faixas que hoje são de estacionamento em trajeto para
bicicletas.
Desde aquela época a Prefeitura sabe que essa é a
alternativa ideal, mas hoje está claro que temos um problema grande porque o
trajeto implantado aumentou o congestionamento na Rosa e Silva, já que ali foi
o único trecho de avenida em toda a extensão da ciclofaixa em que se diminuiu
uma das faixas de rolamento para os carros. A Rua do Futuro recebendo uma
ciclofaixa estaria sendo privilegiado o Parque da Jaqueira, que inegavelmente é
o local de lazer que mais atrai ciclistas na cidade. Mas, principalmente, a via
se tornaria um acesso muito mais seguro para o Centro para os trabalhadores, já
que de lá é fácil atravessar a Agamenon por uma das alternativas no Espinheiro.
É como me disse um engenheiro de tráfego antes da
implantação mal sucedida da Conde da Boa Vista, alternativas eficientes existem
mas é preciso enfrentar a reação de setores da sociedade. O Governo Municipal
errou no Centro, mas ainda tem chance de transformar um projeto mal feito em
uma alternativa mais segura e viável para milhares de ciclistas da Zona Norte
do Recife.
Foto: Fernando Lima
Um comentário:
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