24.5.05

O ANTROPÓLOGO

Seu Silva é policial militar concursado. Uma pena, deveria ter seguido a sua vocação.

A principal função dele atualmente é fazer a vigilância do Aterro Sanitário da Muribeca. Ele tem muito orgulho do processo de reestruturação pelo qual passou o lugar e gosta que as pessoas visitem "sua" maior obra.

- Antes a gente vivia encontrando corpos no meio do lixo.

Não é que a violência tenha acabado no Aterro, mas o processo que levou o Lixão a ser reconhecido com esse novo nome trouxe várias melhorias. Entre elas, a principal é que o lugar passou a ter vigilância constante e isso afastou o crime organizado.

Como a maioria dos policiais, ele trabalha praticamente três expedientes. É que tem dois trabalhos de vigilante e de vez em quando ainda tem que dar o plantão. O pior é que é um tipo raro que faz questão de honrar sua função pública.

Conhece todo mundo na Muribeca e sabe que tem de exercer sua profissão dentro dos limites que a realidade lhe permite.

- Não dá para sair prendendo qualquer um que venda maconha. Tem muita mulher ai que está fazendo isso porque o marido foi preso. Quem ia sustentar a família desse pessoal se ela fosse para a cadeia?

O que mais irrita Seu Silva é justamente não poder expandir esses limites. A falta de recursos é enorme e o policial que está ali não pode querer enfrentar os grandes criminosos do local sozinho. Seria morte certa.

- A gente recebe muitas queixas. Vai do marido que bate na mulher até as piores coisas. O melhor é resolver na conversa, mas nem sempre dá.

É nesse processo de seleção que Seu Silva se expecializou. Há muitos anos, convive com aquele pessoal. Já faz parte da paisagem. Por isso, as ações de prisão na Muribeca sempre passam pelo crivo desse antropólogo.

Tem as que só podem ser feitas por gente de fora. Outras precisam ser realizadas pelo pessoal que está ali diariamente. E alguns casos é melhor nem falar.

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