Ele tinha 18 quando o conheci. Não tenho boa memória, mas tenho certeza do que falo, porque ele estava tendo problemas para se alistar. Precisava vir ao Recife. Como? Nunca tinha saído da Muribeca.
Eu achei engraçado. Sei lá como iam ser as reações dele. Será que ele já tinha tomado banho de mar? Com certeza ia estranhar quando visse uma escada rolante. Talvez tivesse medo de andar de elevador. Leseira isso.
Morava numa casinha construída entre o Sítio do meu pai e o Engenho de São Joaquim. Andei por ali e não vi nem sinal da construção. A taipa deve ter caído e o mato cresceu em cima. Talvez eles também tenham tido medo de continuar morando ali.
Me lembro que a mãe dele falava bastante. O padastro tinha um jeito mais parecido com o dele. Tinha uns dois ou três irmãos mais novos. A família virou na minha cabeça a típica visão dos cortadores de cana.
Escrevi até um texto em que uma das crianças cortava o dedo com a estrovenga, mas isso foi ficção. É que ficou marcado na minha memória as marcas que aquele pessoal sempre tem, do trabalho.
As queimadas matam os bichos. A terra perde a cor. A cana perde o mel.
E aquele trabalho deixava um monte de marcas no povo. Um não meche os dedos. O outro perdeu um dedo. A maioria deixa à mostra rasgões nos braços. Outros escondem as cicatrizes por baixo da camisa.
Mas encontrei Pepéu um dia desses. Como todos ali parece que deixou de trabalhar na cana. Tem família agora. Não perguntei se ele tinha conseguido se alistar. Mas fiquei me perguntando quais seriam as marcas de um catador de lixo.
Penso.
Talvez sejam menos aparentes que as de quem trabalhava na cana.
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